Uma a cada cinco famílias já perdeu um parente no trânsito
DE O TEMPO
A mãe ficou sabendo da morte do filho ao ligar a TV e assistir ao noticiário do meio-dia. Gustavo*, 21, voltava de uma festa com mais dois amigos, na BR–262, entre Uberaba e Campo Florido, no Triângulo Mineiro, em junho de 2011, quando o carro bateu em uma árvore. Os três jovens morreram na hora, mas o impacto foi além e destruiu a vida de muito mais gente e por tempo indeterminado. No Brasil, uma em cada cinco famílias já perdeu alguém vítima de acidente em ruas ou rodovias, e apenas 5,4% dos brasileiros consideram o trânsito seguro.
Os dados são da pesquisa “Comportamento do Motorista”, encomendada pelo grupo Arteris – companhia que reúne nove concessionárias de rodovias no Brasil, incluindo a Autopista Fernão Dias, gestora da via que liga Minas a São Paulo. O estudo, feito em agosto deste ano com 1.030 condutores que circulam em estradas e vias urbanas, concluiu que, ao mesmo tempo em que os acidentes deixam marcas em milhares de famílias, os motoristas insistem em comportamentos irresponsáveis: uso de celular ao volante, consumo de álcool antes de assumir a direção e excesso de velocidade.
“Mesmo conscientes dos riscos, as pessoas continuam cometendo infrações e acham que com elas não vai acontecer um acidente”, disse o diretor-superintendente da Autopista Fernão Dias, Helvecio Tamm. Nas estradas mineiras, ocorreram 6.855 batidas no primeiro semestre deste ano, sendo 2.230 (32%) na BR–381. Nesse período, 386 pessoas morreram em colisões registradas na malha rodoviária mineira, segundo a Polícia Rodoviária Federal.
Já em Belo Horizonte, de janeiro a agosto deste ano, foram 45.044 acidentes, sendo 17,5% deles com pelo menos uma morte, conforme a Secretaria de Estado de Defesa Social. Em todo o ano passado, ocorreram 74.724 colisões.
Comportamento. A pesquisa mostra que o celular tornou-se elemento constante no trânsito. Do total de entrevistados, 51,8% admitem usar o aparelho enquanto dirigem com muita ou pouca frequência (veja abaixo). No Sudeste, o índice é ainda maior: 52,4% – não há dados específicos de Minas. O limite de velocidade também é desrespeitado em algum momento por quase metade dos motoristas no Brasil (48,7%) e mais da metade no Sudeste (52,4%).
Para completar, tem ainda o consumo de bebida alcoólica, que, em maior ou menor frequência, é feito por 26,3% dos condutores. “As pessoas precisam ter consciência de que, ao adotarem um comportamento de perigo, elas colocam em risco a própria vida e a de outras pessoas”, concluiu Tamm. (Com Ana Paula Pedrosa)
* Nome fictício
Mudança de comportamento depende de mais educação
Contradição. Entre os motoristas que afirmam ter comportamento seguro no trânsito, 9,2% não utilizam sempre cinto de segurança, 24,9% dirigem após uso de bebida alcoólica, 47% desrespeitam os limites de velocidade, mais de 50% usam celular ao volante e 34% levaram ao menos uma multa nos últimos 12 meses.
Campanhas. O estudo revela a falta de educação no trânsito. A Autopista Fernão Dias informou que desenvolve ações educativas em escolas e municípios no entorno da BR–381. Segundo a concessionária, houve uma redução de 39% no número de mortes e 8% no de acidentes na rodovia, entre Contagem e Guarulhos (SP), no primeiro semestre deste ano.
Consequência
Luta diária para superar dor da perda
Gustavo tinha acabado de passar no vestibular para engenharia ambiental. Estava cheio de planos, cheio de vida. Morava com amigos, por isso a mãe não sentiu falta do filho logo que o dia amanheceu. Mas a notícia veio da pior forma possível e interrompeu tudo. Até hoje, a família enfrenta no dia a dia uma dor sem fim, um luto que não passa.
A reportagem optou por poupar a mãe e conversou com uma prima de Gustavo, praticamente da mesma idade que ele e que cresceu com o jovem. “Nem consegui dar um abraço de despedida. Foi muito difícil acreditar. A mãe dele já se recuperou muito, mas não é a mesma pessoa”, disse. (LC)