Justiça condena pai e filho à prisão por explorar trabalhadores no Pontal
Do G1 MT
A Justiça Federal condenou pai e filho a mais de seis anos de prisão cada um por manter 21 trabalhadores em condições análogas à escravidão em uma fazenda localizada em Pontal do Araguaia, a 518 km de Cuiabá. A ação foi movida pelo Ministério Público Federal (MPF) após uma fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) descobrirem as condições em que viviam os funcionários daquela fazenda, em 2009.
A decisão é do juiz da 7ª Vara Criminal da Justiça Federal, Paulo Cezar Alves Sodré, e foi publicada no dia 14 de julho. O proprietário da fazenda, Mário Celso Lopes, e o administrador da propriedade, Mário Celso Lincoln Lopes, deverão cumprir a pena, inicialmente, em regime semiaberto. O G1 não localizou as defesas dos empresários.
No processo, eles alegaram que não os funcionários não eram privados de se locomoverem e que inexistia um sistema de servidão por dívida. Eles afirmaram, ainda, que pagaram todos os encargos trabalhistas aos empregados e que o que foi constatado na fazenda constitui apenas irregularidades trabalhistas. Márcio Celso Lincoln ainda negou ser administrador da fazenda.
Segundo consta na ação, a fazenda onde os trabalhadores foram resgatados é destinada à extração de látex de seringueira. No local, fiscais do MTE encontraram, entre maio e junho de 2009, com 21 trabalhadores que não contavam com registro da atividade exercida na carteira de trabalho, bem como uma situação de “servidão por dívidas”, já que eles eram obrigados a comprar em apenas uma mercearia, que pertencia ao primo do gerente da fazenda.
Ao proferir a sentença, o magistrado criticou a postura dos empresários que negaram, durante todo o processo, as irregularidades encontradas pelos fiscais do MTE e anexadas ao processo em forma de depoimentos e fotos. O juiz ressaltou, ainda, que o proprietário da fazenda chegou a reclamar que “sentiu a honra dele abalada pela divulgação do caso”.
De acordo com a denúncia feita pelo MPF, os funcionários viviam em moradias precárias, sem instalações de banheiro e com água para consumo humano armazenada em reservatório sem cobertura, apresentando larvas de insetos. A falta de equipamentos de proteção individual e a armazenagem de embalagens de agrotóxicos nas moradias dos trabalhadores – em contato com as mulheres e filhos deles – também é citada na ação.
Para o MPF, o proprietário da fazenda sabia que os lucros que conseguia com a atividade seringal derivava da exploração de trabalhadores, pois visitava a fazenda de duas a três vezes no ano. O órgão defende, ainda, que as irregularidades também eram de conhecimento do administrador das terras, pois ele percorria a frente de trabalho cerca de duas vezes por mês, mas “nada teria feito para evitar o desempenho da atividade em regime de escravidão”.
Condições degradantes
Na ação, o MPF detalhou que os trabalhadores extraíam borracha dos seringais e aplicavam agrotóxicos nas árvores sem usar nenhum EPI, como botas, luvas ou óculos de proteção, tendo como barreira apenas as roupas do corpo.
Além disso, conforme relatado pelos fiscais do MTE, na “frente de trabalho”, os funcionários não contavam com instalações sanitárias, sendo obrigados a “fazer as necessidades fisiológicas no mato, no meio do seringal, sem qualquer privacidade ou segurança”.
As condições das moradias também foram descritas no processo. Segundo o MPF, os trabalhadores moravam em casas que ficavam a cerca de 20 km da sede da fazenda em “condições indignas, em moradias precárias, em péssimas condições”.
Segundo consta na ação, os fiscais encontraram embalagens cheias de agrotóxicos dentro das residências dos trabalhadores, junto aos seus familiares e crianças. Além disso, foi verificado que uma das casas estava imunda, não possuía urna nas paredes – que era improvisada com pedaços de papelão e de lona plástica preta – permitindo a entrada de ratos e morcegos. A casa também não possuía banheiro e vaso sanitário.
Penas
Mário Celso Lopes foi condenado a seis anos, quatro meses e 15 dias de prisão, além do pagamento de 240 dias-multa.
“Para a fixação do valor do dia multa, observo do interrogatório do réu que ele é empresário, possui fazendas, avido, enfim, recursos financeiros razoáveis que a atividade empresarial lhe proporciona. Assim, fixo cada dia multa no valor equivalente a cinco salários mínimos vigentes à época dos fatos”, afirmou o magistrado.
Como em 2009, o salário mínimo vigente era de R$ 465, o total da multa a ser paga pelo empresário é de R$ 558 mil.
Já Mário Celso Lincoln Lopes foi condenado a seis anos, um mês e 15 dias de reclusão e pagamento de 180 dias-multa, sendo que cada dia de multa equivale a dois salários mínimos vigentes em 2009, totalizando R$ 167,4 mil.
“Deixo de condenar os réus na reparação dos danos causados considerando que já firmaram termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e recolheram as importâncias constantes do respectivo termo, no valor de R$ 388 mil referente aos fundos indicados, doaram veiculo à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE-MT) e pagaram R$ 154.393,21 por danos morais individuais”, afirmou o juiz.