Promotor de Justiça no Araguaia diz que, por pedir retirada de outdoor, é ameaçado e xingado até de “filho da puta”
Caso ocorreu em Canarana; entidade rural quer remoção de promotor da cidade
O promotor de Justiça de Canarana, Matheus Pavão de Oliveira, foi alvo de xingamentos e ameaças após comunicar ao Sindicato Rural do Município uma suposta ilegalidade na implantação de um outdoor na cidade a favor do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). De acordo com o promotor, o outdoor poderia configurar como propaganda extemporânea visando às eleições de 2022, uma vez que o presidente já demonstrou que deve tentar a reeleição.
Ao site MidiaNews, ele afirmou que o sindicato – principalmente o presidente, Alex Wisch – quis criar uma confusão para ganhar “holofote”. Por conta do episódio, o Sindicato Rural de Canarana afirmou que irá pedir a remoção do promotor da cidade.
“O sindicato quis criar uma confusão, me colocando como antagonista para criar uma ‘notícia lacração’. Expliquei para o sindicato que eles podem pintar a sede deles, pintar casa, carro… Tem 200 formas de propaganda que você pode fazer a favor de Bolsonaro que são lícitas”, afirmou.
“A única forma que é proibida em lei está no art. 39, parágrafo 8º da Lei 9.504 e é o outdoor. E eles escolheram justamente essa forma para serem notificados. Deu toda essa confusão e desvirtuaram a questão, para dizer que o Ministério Público Estadual ameaçou o sindicato para retirar o outdoor do local”, acrescentou.
O outdoor em questão foi implantado na última terça-feira (27) pelos ruralistas. Segundo Pavão, ainda que não tenha a frase “vote em mim”, já existem processos transitados em julgado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que apontam que esse tipo de conteúdo é propaganda extemporânea.
“Ninguém é bobo. Você pode apoiar quem você quiser, mas esse tipo de outdoor obviamente configura propaganda eleitoral. Uma coisa é você falar ‘Bolsonaro, nós te amamos’. Outra é dizer ‘Bolsonaro, estamos junto com você’, porque isso já tem uma conotação política”, disse.
Ele citou, como exemplo, um caso recente também em Canarana, ocorrido no ano passado, em que alertou o responsável da necessidade de instauração de um procedimento em razão do fato configurar como algo supostamente ilegal. A pessoa, então, decidiu remover a propaganda e manifestar seu apoio apenas com o seu carro.
“Meu modo de atuação aqui, em casos pequenos como esse, é pedir ao técnico do MPE para ligar e avisar que há uma suposta ilegalidade, que se você remover nada será instaurado. Mas se eu tiver que instaurar, vai virar um processo judicial e uma terceira pessoa, que é o juiz, vai decidir”, afirmou.
“Ele pode decidir que sim ou que não. Se decidir que sim, você pode pagar uma multa de até R$ 15 mil ou R$ 20 mil. O risco é seu. Avalie o risco e me avise. E ninguém nunca reclamou disso”, disse.
O promotor relatou que, após o técnico comunicar o sindicato da instauração de um procedimento se não houvesse a remoção – o que foi interpretado como coação –, o grupo fez uma manifestação em frente ao outdoor e ele passou a receber ameaças e xingamentos via redes sociais, tanto de moradores de Canarana quanto da cidade vizinha, Água Boa.
Pavão declarou ter inclusive áudios da comunicação feita ao presidente do Sindicato Rural que provam que não houve nenhum tipo de abuso por parte da Promotoria.
Ele afirmou que irá processar aqueles que se excederam, já tendo recolhido prints das declarações feitas, onde até mesmo ameaçam pichar o seu carro ou “pegarem ele na rua”.
“Tacharam-me de comunista, petista, petralha, disso para baixo. Você achar que eu sou petista está na sua margem de opinião. Mas me xingaram filho da puta, babaca, incompetente, ignorante… Aí você foge bastante do que pode manifestar”, disse.
“Há um limite. Se você acha que eu sou comunista, eu acho bizarro, mas está no seu livre aspecto de manifestação. Mas se você me chama e filho da puta em uma rede social foge bastante do que pode manifestar”.
Segundo o promotor, foi oferecido a ele pelo MPE a alocação de policiais para garantirem a sua integridade física. Entretanto, ele disse ter negado ao menos no momento.
“Todo esse ódio destilado apenas porque o sindicato criou uma falsa notícia. Vivemos tempos intensos de ódios. Ou você é esquerda ou direita. Não pode ser apolítico e aplicar a lei de forma imparcial, que é o que tenho feito”, afirmou. “
Espero que as ameaças não saiam das redes sociais. Mas se me sentir ameaçado, vou solicitar o apoio do MPE”, disse. Ele ainda afirmou que apesar do sindicato ameaçar pedir a sua remoção do Município, não há amparo legal.
Pavão salientou, ainda, que já era de conhecimento de todos na cidade que ele havia pedido, no ano passado, a troca de posto com outro colega – o que ocorreria neste mês, mas que agora será adiado em razão da situação atual.
O promotor criticou que o grupo do sindicato quer uma “aplicação seletiva da lei” e afirmou que, na última eleição, solicitou a remoção de outdoors de autoria do grupo de oposição e, na época, não houve tanta repercussão e muito menos “destilação de ódio”.
“Ninguém naquela época me chamou de fascista e como a maioria aqui aparentemente vota no Bolsonaro, não teve essa repercussão toda. Mas quando é o contrário, querem a aplicação seletiva da lei. Tira o outdoor do Lula, mas mantém o do Bolsonaro”, disse.
“A única coisa que importa para essas pessoas é o fanatismo de supostamente defender o direito de livre expressão, mesmo que não tenha nenhum inimigo que te proíba disso. Você pode fazer a sua manifestação, ir para a rua se manifestar, só não pode fazer outdoor. E não sou eu quem criou isso. É a lei”, defendeu.
“Se uma mera investigação preliminar causa tanto desconforto a essas pessoas, o que dizer de uma ação civil que será proposta em breve? ”, questionou.
Segundo Pavão, a Procuradoria Regional Eleitoral orientou a todos os promotores eleitorais – papel também exercido por ele no Município – para apurar a existência desse tipo de outdoor que pode configurar propaganda extemporânea.
De acordo com o promotor, a ele cabe exclusivamente pedir a remoção do outdoor que, além de violar regras eleitorais, também violaria regras urbanísticas, por estar em uma faixa colada à estrada, que é de domínio estadual.
“É para saber quem colocou, quem financiou, para apurar se esses outdoor são financiados com recursos públicos ou se esses sindicatos que estão bancando esses outdoors recebem algum tipo de subsídio público”, pontuou.
“Porque, se receberem, automaticamente essa propaganda é irregular, porque você não pode usar o aparato público para fazer qualquer tipo de propaganda”, completou.
MidiaNews – Lislaine dos Anjos