Dona de ônibus apreendido em MT diz que também leva petistas
A Flecha Tur, uma empresa de Mato Grosso dona de ônibus apreendido após os ataques golpistas de 8 de janeiro, diz que alugou o mesmo veículo dias antes para que petistas viajassem a Brasília para participar da posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A empresa afirma também que um outro veículo de sua propriedade já havia transportado militantes do PT para a vigília Lula Livre, montada em frente à Polícia Federal em Curitiba, onde o hoje presidente da República esteve preso em razão da Operação Lava Jato.
A exemplo de outros donos de veículos retidos, a Flecha Tur pediu a restituição do automóvel ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), e aguarda decisão desde o mês passado.
Empresas alegam que foram contratadas para a prestação de um serviço e reclamam de prejuízos com os ônibus parados. Procurado, o gabinete do ministro não respondeu.
O ônibus da Flecha Tur foi apreendido pela Polícia Rodoviária Federal em Sorriso (MT), após ordem de Moraes para que fossem retidos todos os veículos que levaram apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) para a manifestação que culminou com a depredação das sedes dos três Poderes.
A empresa alegou no pedido ao ministro, de acordo com o advogado Reinaldo Ortigara, que seus proprietários não contribuíram para a ocupação e depredação de prédios públicos, não participaram de aglomeração em frente a quartéis e não incitaram nenhuma manifestação.
A Flecha Tur disse que atua “sem matizes ideológicos ou partidários”, conferindo a todos “igualdade de tratamento independentemente de sexo, raça, religião ou orientação política”.
Exemplo dessa conduta, segundo Ortigara, foi o transporte de apoiadores de Lula para a posse do petista em seu terceiro mandato. Foram incluídas no recurso enviado ao Supremo, disse ele, fotos de petistas de Mato Grosso em frente ao ônibus que foi apreendido.
A empresa reproduziu também uma carta manuscrita, datada de 10 de janeiro, em que uma representante do diretório regional do PT declarou que os serviços prestados entre 31 de dezembro e 2 de janeiro aos apoiadores de Lula foi tranquilo e respeitoso.
“A empresa atua sem paixão partidária”, disse Ortigara à Folha. “Houve, inclusive, certa dificuldade de contratar transporte para a posse. Alguns empresários se negaram a levar petistas para Brasília. Esse não foi o caso da Flecha Tur.”
A grande maioria dos apoiadores de Bolsonaro chegou à capital federal de ônibus. No dia do ataque, a Polícia Rodoviária Federal apreendeu 30 veículos só no DF.
Apreensões ocorreram também em outras localidades do país. Uma lista fornecida pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), responsável por fiscalizar a atividade econômica, com todos os ônibus que ingressaram no DF entre os dias 5 e 9 de janeiro, auxiliou nesse trabalho.
O ônibus da Flecha Tur não constou da lista da agência, mas a PRF conseguiu identificá-lo após recuperar imagens em sistemas de monitoramento das estradas.
Segundo a defesa da empresa, os bolsonaristas que usaram o ônibus da Flecha Tur saíram de Tangará da Serra (MT) no dia 7 e chegaram a Brasília na manhã seguinte, por volta das 8h30.
A empresa alega que não praticou qualquer ato para impedir, obstruir ou dificultar a passagem de veículos em vias públicas na capital do país.
Afirma ainda que, após o desembarque dos apoiadores de Bolsonaro, o ônibus regressou a Mato Grosso, chegando a Cuiabá por volta das 2h do dia 9.
Na mesma data, às 14h, o ônibus teria seguido para Sinop (MT), onde buscaria passageiros e os levaria para Paraguaçu Paulista (SP). Foi nesse trajeto que houve a interceptação por parte dos policiais rodoviários federais.
A AGU (Advocacia-Geral da União), órgão que representa juridicamente o governo federal, pediu à Justiça que converta a ação cautelar (medida urgente) que bloqueou os bens de suspeitos de financiar o fretamento de ônibus para os atos golpistas em um processo que garanta a condenação definitiva de ressarcimento aos cofres públicos.
Os valores desse ressarcimento são de R$ 20,7 milhões e foram calculados com base nos prejuízos apontados por Supremo, Palácio do Planalto, Câmara dos Deputados e Senado.
O pedido aguarda decisão da Justiça Federal do Distrito Federal. A AGU diz, na ação, que é um ato ilícito quando alguém que tem direito à livre manifestação e reunião pacífica excede “manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
“Num regime democrático, como no sistema brasileiro, contraria os costumes da democracia e a boa-fé a convocação e financiamento de um movimento ou manifestação com intento de tomada do poder, situação essa que evidencia a ilicitude do evento ocorrido”, diz a advocacia.