Ruralistas tentam reverter medidas de Lula e esvaziar ministério de Marina

Uma série de emendas apresentadas à MP (medida provisória) do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que reestruturou a Esplanada dos Ministérios busca enfraquecer a pasta do Meio Ambiente.

 

As propostas, feitas por parlamentares ligados principalmente ao agronegócio, tentam reverter a destinação de diferentes áreas para o comando da ministra Marina Silva e retomar o organograma da gestão de Jair Bolsonaro (PL).

 

Entre as emendas, estão as que propõem a volta do Serviço Florestal e do CAR (Cadastro Ambiental Rural) para o Ministério da Agricultura e o retorno da responsabilidade sobre a política nacional dos recursos hídricos ao Ministério do Desenvolvimento Regional.

 

Também retornariam à Agricultura o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), além das atribuições sobre política fundiária, agricultura familiar e terras quilombolas, que Lula passou para o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar.

 

Além disso, a política indígena – que atualmente está sob o guarda-chuva do Ministério dos Povos Indígenas – retornaria ao Ministério da Justiça.

 

Há ainda “jabutis” apresentados em outras medidas provisórias, que não tratam sobre o tema, para também tentar mudar alguns desses pontos.

 

Se aprovadas, as emendas retomariam a relação de atribuições entre Meio Ambiente, Agricultura e Desenvolvimento Regional do governo Bolsonaro. À época, com medidas do então ministro Ricardo Salles, hoje deputado federal (PL-SP), a gestão esvaziou a pasta ambiental e turbinou a da Agricultura.

 

Logo na reestruturação do Executivo, Lula redistribuiu setores, fortalecendo as atribuições do ministério de Marina Silva e também o do Desenvolvimento Agrário – o que incomodou personagens ligados ao agro.

 

O deputado federal Covatti Filho (PP-RS), por exemplo, não só propõe a reversão dessas medidas, como sugere a renomeação de algumas pastas, conforme ocorria no governo Bolsonaro: “Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento” e “Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional”.

 

Nas alterações para a Agricultura, inclusive, o deputado praticamente copia o decreto de estruturação do Executivo da gestão anterior, com pequenas mudanças de redação – por exemplo, a troca do termo “abrangidos” por “abrangidas” na descrição de competências da Agricultura.

 

Ele ainda propõe a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar e do Ministério da Pesca. A reportagem tentou contato com Filho desde terça-feira (20), mas não teve resposta.

 

Também fazem propostas para retomar o organograma de Bolsonaro nomes como o atual presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o deputado Pedro Lupion (PP-PR); o ex-presidente do grupo, Sérgio Souza (MDB-PR); a ex-ministra da Agricultura de Bolsonaro, Tereza Cristina (PP-MS); Zé Vitor (PL-MG), um dos parlamentares mais ligados ao setor, e Evair de Melo (PP-ES).

 

Questionado, Lupion afirma que as mudanças acontecem porque todos esses órgãos ou atribuições tocam a política agropecuária brasileira e “dividir a agricultura nacional é bloquear o desenvolvimento do país”.

 

“As mudanças sugeridas e aplicadas pelo governo federal dentro do Ministério da Agricultura enfraquecem o setor e, por isso, estamos prontos para dialogar pela volta da estrutura anterior. A reorganização é necessária para preservar as conquistas até aqui”, diz.

 

Líder da Frente Parlamentar Ambientalista, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) avalia que há risco de reversão nas mudanças feitas por Lula, mas diz acreditar na habilidade do governo de atender às demandas do agro sem abrir mão da agenda ambiental e do enfrentamento à fome.

 

“A estrutura do governo coloca no centro do debate o enfrentamento da crise climática, e essas emendas trabalham na perspectiva de não ter esse cuidado, algo que é ruim para a própria grande agricultura, porque o setor vem sentindo o impacto da diminuição de chuvas, das enchentes e das secas prolongadas, decorrentes das mudanças climáticas.”

 

Já Zé Vitor defende que o sistema anterior era “harmonioso” e “trouxe resultados, independente de coloração partidária”.

 

Evair de Melo afirma que as emendas apresentadas são uma “tentativa de evitar prejuízos” para a agricultura brasileira. “As emendas que apresentei foram trabalhadas em conjunto com a FPA e a CNA [Confederação da Agricultura e Pecuária]”, conta.

 

A reportagem procurou todos os outros parlamentares citados, mas não teve resposta até a publicação da reportagem.

 

Marussa Boldrin (MDB-GO), que está em seu primeiro mandato na Câmara, não só apresentou emendas à medida provisória que reestruturou a Esplanada, mas colocou jabutis em outros textos.

 

Ela propõe vincular novamente a ANA (Agência Nacional de Águas, hoje ligada ao Meio Ambiente) ao Ministério do Desenvolvimento Regional, junto com o Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Também sugere voltar a chamar a pasta de Ministério de Integração de Desenvolvimento Regional, como no governo Bolsonaro.

 

Essas propostas foram apresentadas à medida provisória que trata do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), responsável por privatizações, e não tem ligação com temas ambientais ou agropecuários.

 

Todas as MPs apresentadas pelo governo passam a valer no momento de sua publicação, mas podem ser derrubadas ou modificadas pelo Congresso. Deputados e senadores podem apresentar emendas propondo alterações, que podem ou não ir adiante.

 

Atualmente, há uma disputa entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pelo rito de tramitação dessas medidas.

 

Enquanto isso, o governo Lula ainda patina para formar uma base sólida capaz de aprovar todas as alterações na estrutura dos ministérios —o que pode colocar esses e outros pontos em disputa, uma vez que o tema entre em pauta.

 

 



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