Idealizadores recordam primeira Parada; veja imagens da época

As Paradas do Orgulho LGBT+ Mundo afora acontecem com o objetivo de comemorar e celebrar o orgulho e a cultura LGBTQIA+, mas, além disso, são como um momento de manifestação contra a homofobia, luta por direitos e reinvindicações por melhorias sociais e por políticas públicas para essa população.

 

foi a primeira possibilidade de a gente sair em público para dizer ‘nós existimos!

No Brasil, a mais antiga é a de São Paulo, considerada hoje em dia a maior do Mundo reunindo cerca de 4 milhões de pessoas anualmente, que teve sua primeira edição em 1997. Em Cuiabá, a Parada ocorre desde 2003 e terá este ano a sua 21° edição.

 

Na capital de um dos estados mais conservadores do Brasil, ir para rua é uma forma de resistência, ressaltam os organizadores. O MidiaNews conversou com três pessoas importantes para o nascimento da Parada em Cuiabá: o jornalista Menotti Griggi, o presidente da Associação da Parada do Orgulho LGBTQIA+ de Mato Grosso Clóvis Arantes e o designer de moda Luiz Pitta, organizadores da primeira edição.

 

Clóvis conta que a ideia surgiu no Livremente, primeiro grupo gay fundado em Mato Grosso. “Já havia a Parada de São Paulo e a gente ficava dizendo que tinha que fazer o movimento aqui também. [No grupo] já fazíamos reuniões, atividades… E aí, quando surgiu a ideia da Parada, nós começamos a dialogar, buscar parcerias, convidar as pessoas e saímos com o Menotti para tentar conseguir um trio elétrico”, relembra Clóvis.

 

Já Pitta conta que em certo momento cogitou-se não realizar o ato, com receio se iria mesmo dar certo.

 

“[A ideia] começou tímida, só entre a gente. Muitos acharam que não deveríamos fazer e que não ia ter muito público, que era muito arriscado, que muitos não queriam mostrar a cara. Então tinha todos esses questionamentos”, diz.

 

Além disso, segundo o designer, houve preocupação dos organizadores até com o nome do evento.

 

“O Clóvis ficou com medo de colocar o nome ‘Parada Gay’ e não ir ninguém. Então ela se chamava ‘Parada da Diversidade Sexual de Mato Grosso’. Confeccionamos também um monte de máscaras para o pessoal que queria ir, mas não podia se mostrar”.

 

A coragem e o desejo de arriscar falaram mais alto e em 2003 o movimento saiu nas ruas do Centro de Cuiabá, da Praça Alencastro até a 8 de Abril.

 

“Nós falamos: ‘Vamos fazer a Parada, vamos colocar a Parada na rua’. E fizemos ainda um pouco desacreditados porque não tinha dimensão de como seria fazer uma Parada em Cuiabá, se haveria adesão e se as pessoas iriam para rua. E elas foram!”, comemora Menotti.

 

Acervo APOLGBTQIA+MT

Especial Parada LGBT

Da esquerda para a direita, um homem não identificado, Luiz, Clóvis e Menotti

 

Na época, além do preconceito, mais evidente do que nos dias atuais, a Parada entrava em um cenário de uma cidade com pouquíssimas opções de eventos para esse público. As baladas e barzinhos voltados para a comunidade LGBTQIA+, tão popularizados hoje em dia na Capital, quase não existiam há vinte anos.

 

“[A Parada] foi a primeira possibilidade de a gente sair em público para dizer ‘nós existimos! Em Cuiabá também existe LGBTs’”, afirma Clóvis.

 

“Até hoje tem a questão do preconceito, mas antes era pior ainda. Então você estar à frente, botar a cara, já era um ato de batalha: ‘Olha, eu estou aqui mostrando’”, reflete Pitta.

 

O evento, que reuniu cerca de 30 mil pessoas na edição de 2023, começou tímido em 2003, com pouco mais de mil pessoas. Na época, com menos informação e poucos meios de divulgação, além do preconceito, muitos preferiam não participar.

 

“O maior desafio na época era convencer [as pessoas LGBTQIA+] que eles precisavam ir para rua, que a gente precisava perder o medo. Algumas pessoas ainda usavam máscara, porque não podiam aparecer em público, pois tinham medo de aparecer na televisão e a família ou os chefes verem”, diz Clovis.

 

Segundo Luiz Pitta, a divulgação no começo era feita por panfletos que ele pregava em diversos locais, onde ia de moto com o amigo Mauro Falcão. Quando houve aparição pública, como na TV, geralmente iam ele e Clóvis, pois muitos ainda tinham receio de serem vistos em público.

 

“[Na primeira] foram cerca de mil pessoas, mas a partir daí só se fortaleceu. Então a gente falou: “É isso! Podemos acreditar nesse movimento’”, concluiu o jornalista Menotti Griggi.

Então a gente falou ‘é isso! Podemos acreditar nesse movimento’

 

Muito além de uma “festa”

 

É comum a visão de que a Parada seria uma grande festa ao ar livre, e daí surgem muitas críticas ao evento. Porém, além de, claro, ser uma celebração, os ativistas explicam que a importância do evento vai muito além.

 

“É um momento político em que a gente vai para as ruas para dizer que a nossa população existe, para dizer à população que nós lutamos pelos nossos direitos”, esclarece Clóvis.

 

“Acho que a Parada tem um papel fundamental para as pessoas entenderem um pouco melhor a população LGBT+. Por que a gente precisa ir pra rua? Por que a gente precisa falar sobre direitos civis? Por que a gente precisa falar sobre saúde, sobre cultura?”, reflete Menotti.

 

Neste ano, de eleições municipais, a Parada traz o lema “Nada sobre nós, sem nós: Vote com orgulho”. A ideia é que as pessoas votem em candidatos LGBTQIA+ ou em simpatizantes da causa. Hoje em dia, a Parada é organizada pela Associação da Parada do Orgulho LGBTQIA+ de Mato Grosso (APOLGBTQIA+MT) e conta com apoios público e de empresas privadas.

 

Além disso, o evento deixa um legado econômico à cidade. Setores de hotelaria, transporte, alimentação, dentre outros são alguns dos beneficiados com o ato.

 

Só nesta edição, são esperadas cerca de 20 caravanas que estão inscritas oficialmente. “É o interior vindo para saber como é a luta aqui para poder lá no interior fazer as suas lutas cotidianas também. Isso amplia a nossa voz”, conta Clóvis.

 

O que falta?

 

Nós não conseguimos nenhuma lei no Estado que garanta direitos

 

Nesses 21 anos, algumas lutas permanecem e, por mais que o cenário pareça ter melhorado ou avançado em alguns aspectos, retrocedeu em outros. Os entrevistados ressaltam que conseguir respeito ainda é uma luta e que os políticos do Estado ainda pouco (ou nada) fazem por essa parcela da população, isso quando não trabalham contra, com discursos e posições conservadoras.

 

Em análise do que mudou nessas duas décadas desde a primeira vez que a Parada saiu às ruas, o presidente da APOLGBTQIA+MT denuncia o fato de Mato Grosso ainda ser um dos estados brasileiros mais violentos contra a população LGBTQIA+.

 

“Nesses 21 anos de parada, nós ainda não conseguimos que a Assembleia Legislativa aprovasse o Conselho Estadual de Políticas Públicas para a População LGBTQIA+. Nós não conseguimos nenhuma lei no Estado que garanta direitos para a nossa população”, lamenta Clovis.

 

“Nós somos hoje um dos maiores movimentos de rua de Mato Grosso e estamos dizendo que nossas existências são importantes. Estamos em todas as profissões e pagamos nossos impostos, portanto nós temos o direito de manifestar”, encerrou ele.

O preconceito ainda existe e muita gente quer nos impedir de ter nosso espaço

 

A primeira e a próxima

 

A reportagem do MidiaNews conseguiu reunir registros raros da primeira edição da Parada, em 2003, que pode ser vista abaixo.

 

A concentração desta edição, que será no próximo sábado (29), é na Praça Ipiranga a partir das 14h. Logo depois, a multidão segue em caminhada até a Orla do Porto, onde diversas atrações musicais se apresentarão. 

 

Informações no Instagram da Parada.

 

Veja abaixo a galeria:

 

Imagens: TV Centro América

 



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