PF suspeita que empresário de MT pagou propina a magistrado
A Polícia Federal diz ter encontrado “fortes indícios” de que o empresário de Cuiabá Andreson Gonçalves pagou propina para o desembargador Marcos José de Brito Rodrigues, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
Entendemos haver fortes indícios de que tal desembargador estivesse recebendo propina de Andreson
A informação consta no inquérito policial que subsidiou a Operação Ultima Raio, deflagrada pela PF nesta quinta-feira (24) contra um suposto esquema de venda de sentenças na Corte sul-mato-grossense. A reportagem do MidiaNews teve acesso à decisão que embasou a ação policial.
O desembargador e outros quatros colegas foram afastados do cargo. Andreson e suas empresas, a Florais Transportes e Florais Taxi Aéreo, foram alvos de mandado de busca e apreensão.
A PF acendeu o sinal de alerta ao ter acesso a mensagens trocadas entre Marcos Brito e Andreson, uma vez que este já era investigado por sua relação com o advogado Felix Jayme Nunes da Cunha, que também foi alvo da operação nesta manhã.
Conforme a Polícia Federal, o advogado – que é apontado como um dos cabeças do esquema – recebeu R$ 1 milhão da Florais Transportes em 2017.
A PF encontrou ligações e mensagens entre Andreson e Marcos Brito de 2018 até maio deste ano “demonstrando que possuem contato atual e aparentemente muito próximo”. A maior parte delas, no entanto, foi apagada.
A PF destacou que em maio de 2023 Andreson enviou a Marcos Brito dois prints de extratos de processos no site do TJMS. Na ocasião, o desembargador respondeu: “Beleza. Chegando em SP”.
Oito dias depois, conforme a PF, Marcos Brito repassou as imagens a seu principal assessor no TJMS, identificado como Marcelo, e pediu para ele imprimir os votos dos acórdãos.
Em consulta ao site do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, a Polícia Federal verificou que as ações faziam parte de um conjunto de processos com valor da causa de mais de R$ 64 milhões.
“As mensagens não contêm outros dados sobre o interesse de Andreson em tais processos, nem a qual parte ele estaria ligado. Especificamente nos processos relativos aos prints acima, enviados em 2023 por Andreson a Marcos Brito, não encontramos atuação deste, constando que foram julgados por outros desembargadores. Contudo encontramos a atuação de Marcos Brito, em um julgamento em 2020, em um dos processos relacionados, o qual envolve as mesmas partes e mesmos advogados”, diz trecho do inquérito.
“Considerando que Andreson envia os extratos dos processos a Marcos Brito e que ele proferiu decisão em pelo menos um processo relacionado a eles, somado à proximidade entre eles e demais elementos que serão expostos, além das altas movimentações do primeiro com Felix Jayme, entendemos haver fortes indícios de que tal desembargador estivesse recebendo propina de Andreson”, diz outro trecho.
Transferências de R$ 1 milhão
Conforme a PF, análise de material apreendido em 2018 no escritório de Felix Jayme consta que ele recebeu, no ano de 2017, mais de R$ 1 milhão da conta da empresa Florais Transportes, de propriedade de Andreson, sendo grande parte sacado em espécie.
A PF informou que pesquisas realizadas nos sistemas do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul identificaram ações judiciais da empresa em que apareciam o advogado Felix Jayme como patrono.
“Apesar dessas informações, não foi possível criar uma hipótese plausível que justificasse a transferência de elevados montantes de recursos financeiros de Florais Transportes para Félix Jayme Nunes da Cunha. Ademais, verificou-se na análise dos dados bancários que grande parte dos recursos transferidos para Félix foram sacados em espécie, alguns saques com valor de RS 98.000.00, abaixo dos limites de alerta dos órgãos de controle financeiro. Houve também cheques descontados para pessoas não identificadas”, diz trecho do inquérito.
A operação
No total, a operação cumpriu 43 mandados de busca e apreensão expedidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em Campo Grande (MS), Brasília (DF), São Paulo (SP) e Cuiabá.
Segundo as investigações, o grupo é suspeito de lavagem de dinheiro, extorsão, falsificação e organização criminosa.
Além de Marcos Brito, foram afastados os desembargadores Sérgio Fernandes Martins, Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Aguiar Bastos e Sideni Soncini Pimentel.
Os magistrados também terão que usar tornozeleira eletrônica e estão proibidos de acessarem as dependências dos órgãos públicos e de se comunicarem com outras pessoas investigadas.
A operação é fruto de três anos de investigação da Polícia Federal.
O nome Ultima Ratio faz referência a um princípio do Direito segundo o qual a Justiça é o último recurso do Poder Público para parar a criminalidade.