Militares planejavam matar Lula e Alckmin envenenados ou a tiros

A Polícia Federal apreendeu documentos nos quais militares golpistas falam em assassinar, em dezembro de 2022, o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes.

Trechos do documento constam na representação enviada pela PF ao Supremo Tribunal Federal, que embasou a prisão de quatro militares do Exército e um policial federal nesta terça-feira (19).

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Segundo a PF, “considerando todo o contexto da investigação, o documento descreve um planejamento de sequestro ou homicídio do ministro Alexandre de Moraes”.

No trecho final, no entanto, os golpistas falam que também levantaram informações sobre outros alvos possíveis, identificados por codinomes:

Jeca – que, segundo a PF, faria referência a Lula;
Joca – que, também segundo a PF, seria Geraldo Alckmin;
e Juca – que a PF ainda não conseguiu identificar.

O material foi encontrado em um dispositivo eletrônico do general de brigada Mário Fernandes – descrito como “um dos militares mais radicais” e influente nos acampamentos golpistas montados após a derrota de Jair Bolsonaro na eleição de 2022.

No material, intitulado “Planejamento Punhal Verde Amarelo”, os militares listam uma série de “demandas” operacionais e logísticas para concluir os planos.

E indicam, também, as “condições de execução” – ou seja, as circunstâncias que permitiriam, de fato, executar a chapa presidencial eleita em outubro de 2022.

Há pontos de coincidência, de acordo com os investigadores, entre o planejamento descrito no documento e o evento “Copa 2022”, em que militares chegaram a se posicionar nas ruas de Brasília para tentar sequestrar Moraes. O plano foi abortado antes de qualquer contato com o ministro.

Veja abaixo detalhes do documento encontrado pela PF:

Página 1 – reconhecimento operacional e monitoramento

Na primeira página do documento, os golpistas listam as demandas de “rec op” – segundo a PF, abreviação de “reconhecimento operacional”.

O grupo lista “pontos de controle”, como o Eixo Monumental (via no centro de Brasília onde ficam os ministérios, o Palácio do Planalto e o prédio do STF), a via L4 (também nas imediações dos prédios oficiais) e a Avenida do Exército (via do Quartel-General do Exército, mais afastada).

Lista, também, o tamanho das equipes de segurança pessoal e veículos SUV e blindados.

Segundo a PF, essa página se refere às “diligências necessárias, que já estavam em andamento, para identificar o aparato de segurança pessoal do ministro Alexandre de Moraes, compreendendo os equipamentos de segurança, armamentos, veículos blindados, os itinerários e horários”.

A PF diz ainda que fica claro, já nessa página, que o grupo estava disposto a matar Moraes, seus seguranças e até os próprios membros do plano golpista para cumprir a missão.

“Ou seja, claramente para os investigados a morte não só do ministro, mas também de toda a equipe de segurança e até mesmo dos militares envolvidos na ação era admissível para cumprimento da missão de ‘neutralizar’ o denominado ‘centro de gravidade’, que seria um fator de obstáculo à consumação do golpe de Estado”.

Página 2 – telefones, armas e ‘tempo de ação’

Na segunda página, o documento lista as medidas práticas que deveriam ser tomadas pelo grupo para executar o plano.
Há, por exemplo, uma lista de itens necessários, entre telefones, armas e proteção:

seis coletes à prova de balas;
rádios de baixa frequência;
seis telefones celulares descartáveis;
quatro pistolas;
quatro fuzis, além de munição não rastreável;
uma metralhadora, um lança-granadas, um lança-rojão, também com munição não rastreável;
12 granadas.

Segundo a PF, a lista descreve “armamentos de guerra comumente utilizados por grupos de combate”.

O lança-rojão, por exemplo, é “utilizado principalmente por forças armadas e de segurança para combate a veículos blindados e estruturas fortificadas. É um lançador de foguetes antitanque. A munição é um foguete guiado que possui uma ogiva explosiva”.

Os golpistas afirmam, ainda, que seriam necessárias cerca de duas semanas para a preparação do atentado – e oito horas para a execução.

De acordo com a PF, mais uma vez, os detalhes descritos nessa página coincidem com a tentativa frustrada de sequestrar Alexandre de Moraes em 15 de dezembro de 2022.

Página 3 – ‘condições de execução’ e mais alvos

Na última página do documento, os militares golpistas afirmam que a execução do plano era “viável”, mas “com significativas restrições para uma execução imediata”.

O material lista ainda a situação de outros parâmetros de risco:

possibilidade de êxito: médio, tendendo a alto;
risco de danos colaterais: muito alto
risco de captura: alto
risco de baixas: alto
impactos e sensibilidade no âmbito político: muito alto;
impactos e sensibilidade no âmbito social: muito alto.

“Ainda são necessárias avaliações quanto aos locais viáveis, condições para execução (tiro a curta, média ou longa distância, emprego de munição e/ou artefato explosivo), possibilidades de reforço (Polícia Federal) e proteção do alvo, bem com a intervenção de outras Forças de Segurança”, ressalva o documento.

“Outra possibilidade foi levantada para o cumprimento da missão, buscando com elemento químico e/ou biológico, o envenenamente do Alvo, preferencialmente durante um Evento Oficial Público. O nosso reconhecimento também está levantando as condições para tal linha de ação”, diz o texto.

Já no último trecho do documento, por fim, consta que “foram levantados outros alvos possíveis” – é quando, segundo a PF, o grupo fala em matar também Lula, Geraldo Alckmin e um aliado não identificado.

O texto diz que matar Lula “abalaria toda a chapa vencedora” e a colocaria “sob a tutela principal do PSDB”. O vice, Geraldo Alckmin, na verdade migrou do PSDB para o PSB para disputar as eleições.

Veja o que o documento diz sobre cada um desses alvos:

Jeca (Lula): “considerando a vulnerabilidade de seu atual estado de saúde e sua frequência a hospitais. Envenamento ou uso de química / remédio que lhe cause um colapso orgânico. Sua neutralização abalaria toda a chapa vencedora, colocando-a, dependendo da interpretação da Lei Eleitoral, ou da manobra conduzida pelos 3 Poderes, sob a tutela principal do PSDB”.

Joca (Alckmin): “considerando a inviabilidade do 01 eleito, por questão saúde, a sua neutralização extinguiria a Chapa vencedora”.

Juca (não identificado): “como Iminência Parda (sic) do 01 e das lideranças do futuro Gov, a sua neutralização desarticularia os planos da esquerda mais radical”.

O texto ressalva ainda que a morte de Alckmin e da autoridade apelidada de “Juca” não causaria grande comoção nacional.



Estadão MT