“Defensoria Até Você” atende 459 indígenas em aldeias de Barra do Garças e Campinápolis
Primeiro mutirão da Defensoria Pública para atender à população indígena conta com apoio de órgãos e Poderes como Assembleia Legislativa, Politec, prefeituras e cartórios de Barra do Garças e Campinápolis superou, em dois dias, os 350 atendimentos previstos para todo o evento
Os dois primeiros dias do “Defensoria Até Você – Edição Indígena” superaram as expectativas de atendimento previstas para o total de cinco dias do evento. Na primeira etapa do projeto, executada na aldeia São Marcos, no município de Barra do Garças, 18 e 19 de novembro, foram prestados 459 atendimentos aos xavantes de ao menos cinco grandes aldeias. Lá, eles solicitaram documentos como RG, Certidão de Nascimento, Certidão de Óbito, pediram inclusão no programa social Auxílio Brasil e receberam orientações administrativas e jurídicas.
O projeto – inédito para o público indígena – levou para o cerrado, onde eles vivem a distâncias de até 120 km do núcleo urbano, serviços públicos cujo acesso é deficitário por inúmeras carências como falta de transporte, dinheiro, alojamentos, informações, diferenças culturais, da língua e outros.
O defensor público-geral, Clodoaldo Queiroz, que participou da abertura do mutirão e permaneceu na aldeia São Marcos nos dois primeiros dias de atendimento, informou que uma das providências a serem tomadas pela Defensoria Pública de Mato Grosso (DPMT), ao concluir o trabalho, será a de elaborar relatórios com o diagnóstico e a sugestão de soluções para os problemas encontrados no local.
Esses documentos serão encaminhados aos órgãos responsáveis, com a proposição de ações individuais e conjuntas de curto, médio e longo prazos. “Viemos para cá já sabendo da dificuldade que eles têm em acessar a documentação civil básica e nos propusemos a iniciar a regularização, que é o primeiro passo para garantir a cidadania. Ao chegarmos aqui, também sabíamos que teríamos a oportunidade de fazer um diagnóstico dos problemas peculiares a esses povos, que vivem isolados e à parte dos direitos garantidos aos brasileiros. Ao voltarmos, proporemos ações, medidas e ficou clara a necessidade de mantermos a iniciativa”, explicou.
Queiroz lembra que a falta de documento com foto, por exemplo, impede os indígenas de se matricularem em ciclos sequenciais da educação formal; de acessarem tratamentos de saúde mais complexos, ofertados fora da unidade de Saúde Indígena, de receberem benefícios e de serem tidos como cidadãos.
“Para sair do ensino fundamental para o médio é preciso um atestado de conclusão do curso e as escolas só emitem com base em documento com foto. Dentro do mesmo ciclo essa exigência é adiada, mas ao concluir o fundamental e precisar de uma transferência, esse adiamento não é mais possível. Ao irem para a cidade, buscar tratamento de saúde, a rede exige documento com foto e some-se a isso a dificuldade de se expressar, a timidez, a falta de recursos materiais, tudo isso deixa os problemas da vida dessas pessoas mais difíceis, penosos, sofridos e com chances maiores de não terem solução. Portanto, dar acesso a documentos é o mínimo que o Estado deve garantir”, afirma.
A defensora e secretária executiva da DPMT, Luziane Castro, eleita para comandar o órgão no biênio 2023/2024, afirmou que a avaliação dos trabalhos foi a melhor possível. “O Defensoria Até Você Indígena está sendo excelente. O nosso foco nesse momento é a regularização documental para que eles possam existir como cidadãos brasileiros e tenham acesso à Justiça, cidadania e direitos. Mas, sabíamos também que encontraríamos diversas outras necessidades. Elas existem, estão aqui e vamos mapear”, informou.
Luziane explicou que a necessidade de iniciativas como as do mutirão são urgentes e que outra aldeia será selecionada, em momento oportuno, para receber o projeto. “Esse local foi escolhido, entre outros motivos, por termos maior facilidade de instalar internet, porém, na próxima edição, esperamos contar com internet móvel, o que nos garantirá a possibilidade de irmos mais longe e em lugares mais isolados”.
Para o professor indígena Valter Tehi Abhö’ Ödi, que atuou como interlocutor entre os povos indígenas e a Defensoria Pública para viabilizar o mutirão, receber o atendimento na aldeia é uma das medidas mais importantes que a comunidade está recebendo nos últimos anos. Ele informa que a fonte de renda da população vem de auxílios do governo federal ou empregos públicos na Prefeitura, na Saúde Indígena e na Funai, porém, não chegam para todos.
“Para nós aqui tudo é muito difícil, não temos carros particulares, transporte coletivo, fonte de renda, uma lavoura com produção certa. Para comprar comida temos que pagar para alguém transportar da cidade para cá. Para ter documentos temos que andar quilômetros, sem ter casa ou lugar para ficar. Nosso povo precisa de tudo de educação, de saúde, de renda, de infraestrutura. Vivemos de forma tradicional e precisamos de ajuda para tudo. Logo, receber a ação aqui é algo muito importante para o nosso povo”.
Cartório – O serviço mais procurado pelas famílias foi o de solicitação de certidão de nascimento, óbito e correção de nome indígena em documento já emitido. Ao todo, 196 atendimentos foram solicitados ao Cartório do 2º Ofício de Barra do Garças no mutirão. E algumas das certidões, cujos dados foram checados previamente, já foram confeccionadas e entregues durante os dois dias de atendimento na São Marcos.
Politec – O segundo serviços mais solicitado foi o de emissão de Registro Geral (RG), que atendeu a adolescentes indígenas de 12 a 18 anos, em maioria, explicou o coordenador substituto da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec), Elton da Silva Teixeira.
“Atendemos aqueles em fase escolar que estão com dificuldades em seguir a vida estudantil por falta de documentação com foto. A partir de agora, os dados serão checados, cruzados, uma investigação prévia feita e, em 30 dias, aqueles RGs que puderem ser emitidos serão entregues no posto de saúde aqui da comunidade. O atendimento aqui foi eficaz para o Estado e para eles”, informou.
Administração Municipal – O prefeito de Barra do Garças, Adilson Gonçalves, que apoiou o evento com transporte para os indígenas, alimentação, serviços do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e participou da abertura, explica que existem aproximadamente 650 adolescentes xavantes que praticam atletismo e não podem se inscrever nas disputas, por falta de documentos.
“Essa ação aqui para nós é de suma importância, além dos aspectos sociais, que são necessários e de primeira ordem, temos vários outros problemas decorrentes dessa falta de existência oficial dos jovens indígenas e uma delas é essa amputação civil: eles não podem participar de campeonatos, sendo bons e competitivos, porque não têm identidade para se inscrever. Mas, esse é um primeiro passo para começar a reverter essa realidade e estamos muito felizes por ter a Defensoria Pública trazendo a presença do Estado até eles”, disse o prefeito.
Cras – O Auxílio Brasil, que exige um conjunto farto de informações e de checagem delas para que seja liberado, foi solicitado por 67 famílias na modalidade Benefício de Superação da Extrema Pobreza (BSP), que paga o valor de R$ 25 por pessoa. A maioria das famílias indígenas é composta por grupos de sete a 15 pessoas e no prazo médio de 45 dias elas terão a resposta se poderão contar com o auxílio.
DPMT – A Defensoria Pública, além de organizar o mutirão por meio da Coordenadoria de Ações e Interações Comunitárias (Caic), sob a coordenação da servidora Pâmela Watanabe, atendeu no local com equipe de servidores e defensores a 68 famílias, que solicitaram gratuidade de documentos, ações para correção de nome, solicitação de direitos, orientações administrativas e jurídicas, de forma individual. Além disso, em nível institucional, fará relatórios, diagnósticos das necessidades da população e a interlocução com órgãos e entidades para encaminhar soluções para as demandas identificadas.
Defensoria Até Você – Indígena – O evento foi organizado com a participação da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, as prefeituras municipais, a Fundação Nacional do índio (Funai), Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) e Cartórios. A primeira edição do “Defensoria até Você – Indígena” atendeu nos dias 18 e 19, das 9h às 16h, na escola Dom Fellippo Rinaldi, na aldeia São Marcos. Lá, tiveram atendimento moradores da Terra Indígena São Marcos, que vivem nas aldeias Nossa Senhora do Guadalupe, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora das Graças, Nossa Senhora da Guia e Namunkurá.
Segunda Etapa – Nesta segunda-feira (21/11) o atendimento foi feito na escola José Guilherme, no município de Campinápolis, também das 9h às 16h, e seguirá até amanhã (23/11) para os indígenas das aldeias Palmeira e Santa Clara. O projeto Defensoria Até Você atende em forma de mutirão itinerante grupos populacionais vulneráveis. Essa é a quarta edição do ano, que atendeu em Cuiabá no CPA I e no Lixão, no interior no município de Novo Mundo e agora, em Barra do Garças e Campinápolis, pela primeira vez à população indígena.