Forças Armadas deixaram de agir na terra dos yanomamis
Durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), as Forças Armadas deixaram de atuar no combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami ou tiveram uma atuação insuficiente em, pelo menos, sete ocasiões –o que enfraqueceu ações policiais e contribuiu para a expansão da atividade criminosa no território.
O ápice da atuação de mais de 20 mil invasores foi em 2022, o último ano do governo. A reportagem ouviu fontes com atuação direta em ações de tentativa de desmobilização de garimpeiros, consultou documentos enviados ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao MPF (Ministério Público Federal) e analisou decisões judiciais, o que permitiu identificar sete situações envolvendo os militares que, no fim das contas, favoreceram a permanência do garimpo na terra yanomami.
O território fica numa região de fronteira com a Venezuela. O Ministério da Defesa de Bolsonaro barrou o fornecimento de aeronaves a operações da PF (Polícia Federal) em 2022, feitas em cumprimento a decisão do STF. Quando forneceu, os militares cobraram ressarcimento.
Houve ainda pedidos do tipo para uso de base militar em Surucucu e falta de monitoramento do espaço aéreo do garimpo. A conivência com o garimpo ilegal e a desassistência em saúde indígena na terra yanomami provocaram uma crise humanitária no território, com explosão de casos de malária, desnutrição grave e outras doenças associadas à fome, como infecções respiratórias. No último dia 20, o governo Lula (PT) declarou estado de emergência em saúde pública na terra indígena.
Os casos que demandam mais urgência -tanto na assistência em saúde no próprio território, nas regiões de Surucucu e Auaris, quanto nos transportes aéreos a hospitais em Boa Vista (RR)- são os de desnutrição grave e malária. Cinco dias depois, em atendimento a uma determinação do ministro da Justiça, Flávio Dino, a PF em Roraima instaurou um inquérito para investigar a suspeita de crime de genocídio de indígenas yanomamis durante o governo Bolsonaro.
Serão investigados garimpeiros (tanto os que estão na linha de frente quanto os operadores da logística do garimpo, donos de maquinários e aviões), ex-coordenadores de saúde indígena e agentes políticos, o que pode incluir o próprio ex-presidente, incentivador de mineração em terras indígenas.
As frentes de investigação sobre genocídio foram ampliadas com uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que determinou que a PGR (Procuradoria-Geral da República) investigue a suposta prática do crime por parte de autoridades do governo Bolsonaro.
Barroso encaminhou ainda a determinação de investigação sobre genocídio e outros crimes ao MPM (Ministério Público Militar), um indicativo de que crimes militares foram cometidos por fardados ou ex-fardados durante a gestão passada.
Em 2022, dos 3 ciclos de operações planejadas para a retirada dos invasores da terra yanomami, apenas 1 contou com aeronaves das Forças Armadas, segundo fontes da PF ouvidas pela reportagem sob a condição de anonimato. Esses ciclos foram pensados para cumprimento de ordem do STF de desintrusão em sete terras indígenas tomadas por garimpo, entre as quais a terra yanomami, a maior do Brasil.
No único ciclo em que houve fornecimento de aeronaves, a PF desembolsou de seu orçamento R$ 2,5 milhões para o custeio de horas por voo de uma única aeronave. Na operação, houve destruição de motores e equipamentos a serviço do garimpo.