MidiaNews | As tradições indígenas
Como ousam reduzir nossa existência a seres inferiores de pouca inteligência quando somos ricos em nossas culturas e cosmologia? Não se envergonham de nos silenciar ao reduzir a coragem das nossas mulheres a apenas corpos exóticos? Ou de reforçar estereótipos desrespeitando nossas pinturas e adereços sagrados?
Por que decidem nos “homenagear” no Carnaval, mas quando protestamos por nossos direitos dizem que somos nós os invasores? Por que quando exaltamos nossas culturas e reforçamos nossa identidade somos questionados sobre elas? “São índios de verdade?”.
A ativista Samela Sateré Mawé afirma que com fantasias e “homenagens as pessoas reproduzem estereótipos sobre nossos povos. Sempre vejo essas pessoas baterem a mão na boca, falar errado, sexualizar corpos… Coisas que nós não fazemos. São estereótipos assim que queremos desconstruir. Outra questão está relacionada a nossos adereços e pinturas sagradas, que não podem ser banalizados nem descaracterizados. É uma questão de respeito às nossas cosmologias”.
Em sua maioria, as pessoas que escolhem utilizar pinturas e adereços indígenas no Carnaval não estão preocupadas com os significados sagrados daquilo ou com a realidade dessas comunidades, tampouco se importam se reforçam o imaginário de um indígena selvagem, burro e preguiçoso. Reforçar esse tipo de estereótipo pode não ferir diretamente uma pessoa indígena específica, mas fortalece o racismo estrutural.
Quando pensamos em racismo logo pensamos em uma violência direta contra uma pessoa —quando ela é impedida de entrar em algum lugar ou recebe salário inferior ou é ofendida. Mas, para compreender o racismo, é necessário entender o conjunto estrutural, como nos ensina Silvio Almeida. O ministro e professor nos diz que o racismo é uma forma de racionalidade, uma forma de normalização das relações. É formado por ações conscientes e inconscientes que sustentam as desigualdades, entranhadas na economia, na política e na subjetividade.
Nunca se diz que há terras demais para grandes e ricos latifundiários, que têm o direito de protegê-las a qualquer custo. Mas sempre se diz que há muita terra para poucos indígenas. E nossos territórios permanecem sob ameaças e invasões.
Vemos esse racismo expressado até no modo como somos tratados nos estabelecimentos comerciais; seremos bem tratados ou seguidos pelo segurança?
Lembremos mais uma vez a situação do povo yanomami, denunciada por meses durante o governo Bolsonaro sem que ninguém tomasse uma atitude. Normalizamos e naturalizamos a violência contra as pessoas indígenas.
Txai Suruí é Coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia