Juíza cita “masculinidade tóxica” e manda advogado a júri popular
A Justiça acolheu pedido do Ministério Público Estadual (MPE) e determinou que o advogado Nauder Júnior Alves Andrade seja levado a júri popular por tentativa de feminícidio contra a namorada, em Cuiabá.
A palavra da mulher deve ser especialmente valorada, desde que coerente com as demais provas
A decisão é assinada pela juíza Ana Graziela Vaz de Campos Alves Corrêa, da 1ª Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher.
O crime ocorreu no dia 18 de agosto em um condomínio da Capital. A vítima foi agredida com socos, chutes e golpes de barra de ferro. Ela também foi enforcada e chegou a desmaiar algumas vezes.
Na mesma decisão a magistrada também manteve a prisão do advogado para garantia da ordem pública, integridade física e psicológica da vítima e, também, por conveniência da instrução criminal.
Ana Graziela citou que as provas não deixam dúvidas de “que o crime foi praticado no âmbito da violência doméstica contra a mulher, tendo como base as questões de gênero, substancialmente, o desdém pela vítima como sujeito de direitos e vontades, o machismo e a masculinidade tóxica que trata a mulher como objeto de posse daqueles que com ela se relacionam”.
Ela criticou duramente o advogado que, conforme ela, durante todo o seu interrogatório, tentou culpabilizar a vítima pela agressão, atribuindo a ela conduta desonrosa.
“Assim, cumpre ressaltar que, neste contexto e considerando a natureza dos delitos praticados no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, geralmente praticados com a ausência de testemunhas, a palavra da mulher deve ser especialmente valorada, desde que coerente com as demais provas produzidas nos autos e apresentada sem contradições, o que ocorreu no caso dos autos”, escreveu.
“Feitas essas considerações e, em conformidade com as recomendações que tratam da matéria, ressalto, desde já, por óbvio, que não serão apreciadas e muito menos julgadas condutas atribuídas à vítima (dependência química, prostituição), já que estas, mesmo que devidamente comprovadas, o que não ocorreu no caso dos autos, de forma alguma, podem ser tidas como justificativa para a violência perpetrada pelo denunciado., acrescentou.
A juíza ainda destacou que as demais provas colhidas nos autos colaboram com as declarações da vítima. Ana Graziela frisou que ela só não foi vítima de feminicídio por ter conseguido deixar o local onde estava sendo agredida.
O caso
Conforme a denúncia do MPE, o casal namorou por cerca de 12 anos em uma relação sempre conturbada por conta do comportamento agressivo do advogado, que seria usuário de entorpecentes.
No dia 18 de agosto, o casal estava na residência da vítima já deitado, dormindo, quando por volta das 3h da madrugada Nauder se levantou e foi até o banheiro, onde teria usado drogas.
Ao voltar para o quarto, diz a denúncia, ele tentou manter relações sexuais com a vítima. Diante da recusa, Nauder teria passado a agredi-la com violentos socos e chutes, além de impedir por horas que ela saísse de casa.
Conforme o MPE, ele pegou uma barra de ferro usada para reforçar a segurança da porta da residência e passou a golpeá-la e a enforcá-la.
A vítima chegou a desmaiar e, ao retomar os sentidos, aproveitou a distração do namorado para pegar a chave e fugir.
Ela buscou por socorro e foi levado para um hospital. Segundo o médico que a atendeu “ela não morreu por ser forte, ou algo sobrenatural explica sua sobrevivência”.