Estudo encontra chumbo no leite materno de mulheres de São Paulo
Um estudo publicado na revista Frontiers in Public Health encontrou metais como arsênio, mercúrio e chumbo no leite materno humano. O chumbo pode afetar o desenvolvimento da linguagem em crianças pequenas. Mesmo com a presença do metal, pesquisadores reforçam que o leite materno é o melhor alimento para bebês.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda que os bebês sejam alimentados exclusivamente com leite materno até os seis meses de idade. E que, mesmo após a introdução de outros alimentos, sigam sendo amamentados até, pelo menos, os dois anos de idade.
O leite materno é o melhor alimento para o bebê por ser totalmente adaptado às suas necessidades nos primeiros anos de vida. Além de conter todos os nutrientes de que a criança precisa, é o único alimento que contém anticorpos e outras substâncias que protegem de infecções comuns, como diarreias e infecções respiratórias.
O estudo mostrou que um terço das 185 das lactantes observadas na cidade de São Paulo tinham o leite contaminado pelos metais. Segundo o estudo, a maior taxa de detecção no leite humano foi de arsênio (38,6%), mercúrio (23,9%) e chumbo (22,8%). A concentração média (DP) foi de 2,76 (4,09) ?g/L; 1,96 (6,68); 2,09 (5,36); respectivamente.
Nathalia Naspolini, pós-doutoranda associada ao Laboratório de Microbioma Humano (ICB-II/USP) e uma das responsáveis pelo estudo, explica que 500 crianças estão sendo acompanhadas dos três meses de idade até o quarto ano de vida. A pesquisadora afirma que foi encontrada uma correlação entre a presença de chumbo no leite materno e uma queda no desenvolvimento da linguagem.
Foi utilizada a escala Bayley III para avaliar o desenvolvimento de crianças de três meses, entre cinco e nove meses e entre 10 e 16 meses. “Vimos que esses bebês expostos têm um declínio do desenvolvimento da linguagem comparado aos bebês não expostos”, explica.
A pesquisadora ressalta que o Bayley III não é um teste de diagnóstico e que o bebê, mesmo que não tenha atingido a marca de desenvolvimento esperada para sua idade, pode alcançá-la posteriormente e não apresentar nenhum problema de crescimento. “Mas pode ser que não, pode ser que na vida adulta ele fique com algum comprometimento. Aí você precisaria de estudos mais longos para saber”, conta.
Segundo o estudo, a presença de chumbo no leite, no sangue materno ou no sangue do cordão umbilical é inversamente relacionado ao neurodesenvolvimento de crianças. E, apesar de a pesquisa encontrar concentrações menores do que outros estudos realizados anteriormente, ainda assim as crianças apresentaram competências linguísticas mais baixas.
Naspolini explica que o chumbo é especialmente prejudicial para as crianças porque elas não têm todos os órgãos e sistemas desenvolvidos, como, por exemplo, a barreira gastrointestinal. Por uma questão fisiológica, os bebês podem absorver mais os metais pesados do que um adulto.
A pesquisadora ressalta que nenhum dos metais encontrados pelo estudo no leite materno são vitais para o corpo humano, como o cobre e o zinco. Apesar de o limite tolerado de contaminação do leite por chumbo esteja entre 2 e 5 ?g/L, “não tem uma quantidade que deveria ser considerada segura. Com quantidades menores do que isso, vimos um efeito deletério”, afirma Naspolini.
As mães podem ser expostas a metais pesados pelo ar, pela água e pelo solo, segundo a pesquisadora. No ar, o material particulado pode vir, por exemplo, da fumaça dos carros.
“Além disso, o chumbo e muitos outros metais são emitidos por indústrias, principalmente siderúrgicas. O descarte inadequado ou o lançamento dos restos industriais no meio ambiente pode contaminar os alimentos e a água. Poderiam ser várias formas de exposição da mãe”, explica.
O mercúrio também é associado a problemas graves de desenvolvimento. No Pará, crianças da etnia munduruku apresentam problemas de coluna e dificuldades para andar e falar. A principal causa, dizem os médicos, é a contaminação do solo, água e peixes por mercúrio utilizado no garimpo ilegal.
O índice de contaminação nos mundurukus é um dos mais altos do país. Segundo uma pesquisa feita em 2019 pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), cerca de 57,9% apresentaram níveis de mercúrio acima do limite máximo de segurança estabelecido por órgãos de saúde internacionais, como a agência ambiental americana (EPA-US, na sigla em inglês) e a OMS (Organização Mundial da Saúde).