Mato Grosso é o estado com mais mortes por acidentes em silos

Mídia News

Mato Grosso é o estado que mais registrou mortes por acidentes em silos, conforme reportagem da BBC News Brasil, divulgada nesta terça-feira (28). Ao todo, foram 28 casos registrados nos anos de 2017 e até julho de 2018. Confira a reportagem completa aqui.

Os municípios de Sorriso e Canarana foram os que mais tiveram mortes registradas nesse período, sendo sete casos em cada um. No caso de Sorriso, o município também é apontado como o que detém o maior valor de produção agrícola – R$ 3,2 bilhões em 2016, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Os dados foram levantados pela BBC News Brasil a partir de casos noticiados pela imprensa. Isso significa, segundo os especialistas, que o número de ocorrências pode ser maior, uma vez que nem todas as mortes podem ter sido registradas.

A reportagem revela que, desde 2009, ao menos 106 pessoas morreram em silos de grãos no país, sendo a maioria delas por soterramento.

O ano com mais acidentes fatais foi 2017, quando 24 mortes foram registradas, alta de 140% em relação ao ano anterior. Em 2018, foram 13 ocorrências até julho – o que indica que o número de mortes deve se manter no mesmo patamar de 2017, considerando-se o histórico de distribuição das ocorrências ao longo do ano.

Casos em Mato Grosso

Em julho de 2017, um garoto de oito anos morreu após cair em um silo de grãos em que o pai, um caminhoneiro, fazia o corregamento da carga, em Tangará da Serra .

O Corpo de Bombeiros chegou a retirar a criança do silo. Porém, ela não resistiu e morreu no hospital com parada cardíaca.

No mesmo ano, o trabalhador Edivaldo Silva, de 40 anos, morreu enquanto fazia a manutenção de um silo de armazenamento de soja da empresa Ovetril Óleos Vegetais, no Distrito de Boa Esperança do Norte, em Sorriso.

No dia, ele chegou a ser socorrido, mas não resistiu aos ferimentos e morreu após dar entrada no Posto de Saúde Familiar (PSF) do distrito.

No caso mais recente noticiado pelo MidiaNews, em abril deste ano, Jeorge da Silva Costa, 34 anos, morreu também soterrado em um silo de milho, da empresa Armazens Binotti, em Lucas do Rio Verde (354 km de Cuiabá).

O caso teria ocorrido de madrugada, mas o socorro só foi chamado horas depois. No momento em que o corpo foi encontrado, o trabalhador estava de bruços e com a cabeça coberta pelos grãos.

Gases tóxicos em silos

O tenente Gustavo Souza, do Corpo de Bombeiros de Sorriso, disse que já atendeu quatro casos de soterramentos em armazéns. Em todos eles, não houve sobreviventes.

Segundo ele, em alguns casos, o trabalhador cai nos grãos e é soterrado após passar mal com gases tóxicos produzidos por sua fermentação.

Há ainda relatos de mortes são causadas unicamente pela inalação desses gases – como em ocorrências registradas em Poços de Caldas (MG), Cachoeira do Sul (RS) e Tangará da Serra (MT).

No acidente em Tangará, em 2011, a vítima foi justamente um bombeiro que tentava resgatar dois trabalhadores que haviam passado mal com gases tóxicos em um silo com soja. O soldado Valmir Bezerra de Jesus desmaiou durante a operação e passou 17 dias internado antes de morrer. Os dois trabalhadores que ele ajudava sobreviveram.

As normas de segurança em silos incluem o uso de sistemas de ventilação e de detecção de gases tóxicos. Em situações extremas, trabalhadores só devem entrar nas instalações com máscaras de oxigênio.

Souza diz que resgatar trabalhadores nessas condições é uma das atividades mais temidas entre seus colegas. “Se a gente não toma cuidado com nossa própria segurança, também vira vítima.”

O levantamento mostra ainda que acidentes fatais ocorreram tanto em armazéns de cooperativas (normalmente geridas por grupos de produtores rurais) e de fazendas individuais, quanto em silos de multinacionais que comercializam grãos, conhecidas no setor como traders.

Foram registradas mortes em armazéns das gigantes Cargill (4), Bunge (2) e Amaggi (1).

Em nota à BBC News Brasil, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), que representa as três multinacionais, diz que os silos de todas as propriedades e empresas ligadas à associação estão sujeitos a um rígido controle de segurança, que inclui a identificação de riscos, medidas preventivas e capacitação profissional.

Silos que armazenavam milho e soja predominam entre os locais de acidentes fatais, mas também houve mortes em armazéns de arroz, café, açúcar, ração animal e feijão.

Em seis casos, os mortos não eram trabalhadores, mas parentes que os acompanhavam e jamais poderiam ter entrado nos silos.

Em 2017, uma mulher morreu soterrada em Alta Floresta (MT) enquanto levava um prato de comida ao marido, que trabalhava ali. Dois anos antes, um menino de 8 anos foi soterrado quando brincava em um silo na fazenda dos avós, em Três Lagoas (MS).

Desde 2015, outros dois meninos de 7 anos morreram soterrados em armazéns em Tangará da Serra (MT) e Marechal Cândido Rondon (PR), e uma menina de 9 anos morreu encoberta pela soja em Cerrito (RS).

Os acidentes ocorrem em um momento em que o país amplia a quantidade de armazéns agrícolas para acompanhar o aumento na produção.

Entre 2000 e 2016, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a capacidade de armazenagem de grãos no país cresceu 80%, favorecida em grande medida por linhas de crédito públicas.

Apesar do aumento, a companhia diz que a capacidade de armazenamento do Brasil precisaria crescer mais 48% para cobrir toda a produção atual.

Fiscalização do MPT

O Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso disse, em nota, que o número de empresas fiscalizadas em setores que utilizam armazéns agrícolas (como comércio atacadista de soja, moagem de trigo e beneficiamento de arroz) passou de 35, em 2016, a 713, em 2017. Em 2018, segundo a pasta, já houve 607 empresas inspecionadas.

O MPT disse, ainda, que há hoje 15 silos e armazéns interditados por condições inadequadas no Estado. Afirma, porém, que “muitos dos armazéns (em Mato Grosso) estão localizados em zonas rurais (…), o que dificulta a inspeção in loco”.

“Devido ao tamanho do Estado, é pensado também em outras formas de intervenção para potencializar as adequações, somando-se às inspeção físicas, tais como reuniões com os empregadores, notificação coletiva e ações fiscais indiretas”, disse em nota.