Polícia pede arquivamento do caso e revolta família: Injustiçado
O delegado Marlon Conceição Luz concluiu o inquérito que investigava a morte do pioneiro João Antônio Pinto, de 87 anos, em Cuiabá. Ele entendeu que o policial civil Jeovanio Vidal Griebel, que matou o idoso, agiu em legítima defesa, e pediu o arquivamento do caso (Confira a íntegra AQUI).
É revoltante. Foi uma decisão tomada de forma parcial, não observaram todo o contexto
João Pinto foi morto com um tiro acima do peito, em 23 de fevereiro, no hangar de sua propriedade, na região do Contorno Leste, no Bairro Jardim Imperial. Nesse dia, o idoso iria festejar o aniversário da esposa, com quem foi casado por 64 anos, e nunca mais voltou.
Griebel é acusado de ter agido a pedido de seu cunhado, Elmar Soares Inácio, com que João Pinto teria se desentendido cerca de meia hora antes, por conta de uma invasão na propriedade do idoso.
Segundo a defesa, a família do pioneiro está indignada com o pedido de arquivamento do caso, e pede justiça.
“Não acreditamos que essa decisão seja justa. Achamos que pode ter havido um corporativismo e não vamos nos calar, não vamos aceitar. É revoltante. Foi uma decisão tomada de forma parcial, não observaram todo o contexto”, disse a advogada Gabriela Zaque, que representa a família.
“Seu João foi injustiçado. Ele estava dentro da sua propriedade e foi assassinado cruelmente no dia do aniversário da esposa. Foi um trauma para a família e eles ainda têm que lidar com uma decisão dessas da Polícia”, completou a advogada.
O Ministério Público Estadual é quem agora analisa o caso e deve decidir sobre os rumos do caso. “Agora vamos buscar o Ministério Público para que a justiça seja feita em nome dele”, afirmou a defesa.
Arquivo pessoal
João Antônio Pinto, de 87 anos, chegou em Mato Grosso na década de 60
Entenda o caso
Três viaturas descaracterizadas chegaram à propriedade do idoso cerca de meia hora depois de a vítima se desentender com o cunhado de Jeovanio. A equipe que foi até a propriedade de João Pinto é lotada na Delegacia de Estelionato.
Um dos laudos da Politec apontou que o atirador que matou o pioneiro estava a pelo menos 12 metros de distância da vítima e fora do hangar onde o corpo foi encontrado.
Conforme a perícia, o atirador efetuou ao menos um disparo de arma de fogo, e João Pinto foi ferido na altura do ombro direito.
A bala atravessou a vítima, e o orifício de saída foi encontrado na região escapular esquerda, o que indica que João estava de lado quando foi atingido e não de frente.
Já a perícia realizada no aparelho DVR que deveria conter as imagens da morte do pioneiro revelou que não há registros do momento do crime, apenas de antes e depois de o idoso ser morto.
O perito identificou que a bateria que mantém as configurações do dispositivo salvas após o desligamento estava sem carga.
“Sendo assim, na ausência de alimentação (falta de energia ou desligamento do dispositivo), todas as informações de configurações do dispositivo são perdidas, inclusive data e hora”, diz trecho do documento ao qual o MidiaNews teve acesso.
A decisão
De acordo com o entendimento do delegado, “não foram encontradas provas que indicassem uma intenção prévia de matar a vítima” e, segundo ele, do ponto de vista da investigação policial, foi “uma ação respaldada pela legítima defesa”.
De acordo com a versão dos policiais, o pioneiro teria sacado uma arma da cintura e a apontando na direção deles. Para o delegado, a partir dessa narrativa, os policiais “se viram diante de uma ameaça à sua vida, uma vez que a vítima portava a arma de forma irregular e com energia suficiente para provocar lesões e causar a morte”.
Para o delegado, o fato da vítima ter sido atingida por um único disparo ainda indica que houve “moderação” no uso da força. “O policial agiu com a intenção de se proteger e de proteger sua equipe ao perceber a agressão iminente”, completou.
No documento, o delegado afirma que a Polícia Civil recebeu informações concretas sobre a prática do crime de porte ilegal de arma de fogo. O informante foi Elmar, suposto grileiro nas terras do seu João.
A versão de que ele ameaçou uma pessoa no caminho não tem como ser comprovada
Elmar disse que o idoso estava armado e realizando ameaças. “Em virtude das informações, foram formadas duas equipes de investigadores para verificar a veracidade dos fatos”, afirmou o delegado.
Elmar afirmou em seu depoimento que seguiu o idoso até a sua propriedade e fotografou a placa do seu carro, e depois ligou para o cunhado policial.
Em todo o documento, o delegado argumenta João Pinto portava a arma ilegalmente e, portanto, estava em situação flagrancial.
Ele ainda pediu à Justiça, que as armas do idoso sejam destruídas e que a do policial devolvida à Polícia Civil.
Segundo a família, João Pinto era Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC) e tinha sim o registro da arma.
“O porte ilegal é quando você é pego na rua com a arma, já a posse, você pode usar a arma na sua propriedade. Seu João estava em sua propriedade. A versão de que ele ameaçou uma pessoa no caminho não tem como ser comprovada, é uma palavra contra a outra, e ele está morto”.
Depoimento
O caseiro da propriedade, que trabalhava com seu João há 11 anos, disse que não viu o patrão apontando a arma para os policiais, pois se agachou quando tudo aconteceu.
“O declarante viu a vítima se abaixar e sacar a arma que possuía, e ao levantar, segurando a arma foi atingido por um disparo de arma de fogo; que o declarante não viu a vítima apontar a arma”, diz trecho do depoimento.
De acordo com Gabriela Zaque, o caseiro foi ouvido logo após presenciar a morte do patrão e sem um advogado para acompanhá-lo.
“A Polícia entrou lá sem mandado, sem flagrante, porque de acordo com o processo penal, você só pode entrar na casa de alguém se você tiver um mandado do juiz ou se tiver acontecendo um flagrante de um crime. Ali não estava ocorrendo flagrante de nenhum crime”, disse a advogada.
Trecho da decisão:
“Diante da análise do todo exposto, conforme os interrogatórios dos suspeitos, laudos periciais juntados aos autos e diante de todo o contexto fático e elementos produzidos, entendo, salvo melhor juízo, que o policial Civil Jeovanio Vidal Griebel, atuou amparado pela excludente de ilicitude, prevista no art. 23, inciso II, do Código Penal, uma vez que, em defesa própria e de terceiros utilizou-se moderadamente dos meios necessários, para repelir a injusta e atual agressão. Dessa forma, deixo de indiciá-lo, por entender que, embora existente o fato típico previsto no art. 121 do Código Penal, o comportamento do investigado foi lícito e permitido pelo ordenamento jurídico.
Por fim sugiro o arquivamento do presente Inquérito Policial (salvo melhor juízo) e coloco a Polícia Judiciária Civil à disposição para qualquer diligência complementar que se fizer necessária.”
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