Seis meses depois, filha relata dor, expõe trauma e espera Justiça

A família do advogado Renato Nery, assassinado em julho do ano passado em Cuiabá, espera por pistas que possam levar ao esclarecimento do caso e que apontem quem foi e de onde saiu a ordem para a execução.  

 

é difícil fazer uma ideia de quem possa ter ficado tão magoado […] a ponto de determinar uma execução desse nível

Em entrevista ao MidiaNews nesta semana, a filha mais velha, Renata Gomes Nery, falou sobre a dor da perda, do trauma que viveu e disse esperar por Justiça.

 

Renata é mais velha dos três filhos de Nery, que ainda tinha Lívia Gomes Nery, a do meio, e o caçula, que também se chama Renato Gomes Nery.

 

Ela concedeu entrevsista acompanhada do advogado da família, Walmir Cavalheri.

 

 

Segundo o profissional, a família tem certeza que o assassinato tem ligação com uma disputa de terras no município de Novo São Joaquim (440 km de Cuiabá), de onde dezenas de pessoas foram retiradas após Nery e seu cliente vencerem uma batalha judicial travada há décadas.

 

“Nós estamos convictos que esse crime foi em decorrência de problemas agrários em Novo São Joaquim, que ele vem advogando nesse processo desde 1988 e ali assumiu um contrato de risco. Em 2016, quando resolveu que a posse voltaria para o cliente dele, foram muitas famílias retiradas da área, que ocupavam ilegalmente”.

 

“Quando eles foram retirados, criou toda essa revolta. Isso envolve dezenas de famílias e centenas de pessoas. Então para nós é difícil fazer uma ideia de quem possa ter ficado tão magoado ou se sentindo tão ofendido a ponto de determinar uma execução desse nível”, disse Walmir.

 

“São muitas pessoas envolvidas em 30 anos rodando essa questão. Então, quem pode ser? Pode ser qualquer um”.

 

 

Renata acredita que a execução em frente ao escritório revela que foi algo ligado a sua atuação profissional.

 

“O crime foi cometido no escritório assim que ele estava chegando. Então supõe-se que tenha alguma relação com a profissão dele. E ele tinha uma rotina muito igual de estar no escritório, de fazer pilates, de ir sempre nos mesmos lugares”, disse a filha.

 

“A pessoa sabia o horário que ele iria chegar, a gente acredita que foi muito bem planejado. E pela complexidade do crime, por isso essa demora [em descobrir o autor]”, completou.

 

A pessoa sabia o horário que ele iria chegar, a gente acredita que foi muito bem planejado

 

O advogado e as filhas acreditam na mesma hipótese, pois, segundo eles, Renato não tinha outros problemas ou inimigos que o odiariam a ponto de planejar uma execução.

 

“Tanto os filhos quanto eu temos pleno conhecimento de toda a vida do Renato. Inclusive eles [policiais] fizeram questão de fazer uma rápida apreensão do celular dele, do computador; e de imediato eu já falei: ‘Não perca tempo, porque aí não tem nada’, contou Walmir.

 

“A maioria das conversas ultimamente ele colocava na viva voz para a gente. Mas eu creio que a Polícia tem que explorar todos os ângulos mesmo. E eles acharam que poderia haver um sucesso igual ao que houve com o caso do outro advogado que faleceu”, completou.

 

Walmir se referiu ao caso de Roberto Zampieri, executado a tiros em Cuiabá em dezembro de 2022, cujo conteúdo do celular não só ajudou na apuração do assassinato como também desencadeou investigações de vendas de setenças na Justiça.

 

Ambos relataram que Renato não recebia ameaças e que estava vivendo um período bem feliz.

 

 

Complexidade do crime e demora

 

O advogado e a filha relataram o bom planejamento das pessoas que arquitetaram o crime. O executor chegou pela contramão por uma rua que não tem câmeras e ficou, inclusive, em um ponto cego dos equipamentos de vigilância do escritório.

 

nada vai trazer meu pai de volta. A gente só espera que logo tenha um esclarecimento

“A gente sabe que foi uma coisa muito bem estudada. Foi diferente do outro caso [Zampieri], que o executor foi lá dentro do escritório do advogado, conversou com ele, foi pego pela câmara na hora que estava na fuga. A coisa está sendo meio difícil de desvendar por causa da forma que eles fizeram a execução”, afirmou o advogado.

 

Com isso, a demora das investigações em descobrir o executor, a motivação e o mandante vem sendo compreendida pela família, que disse acreditar no trabalho da Polícia.

 

“A gente acredita na Polícia e que o serviço que eles estão fazendo é o que tem que ser feito. Por mais que seja angustiante pra gente, acho que até para que as investigações corram de uma forma que não vaze, tem que ser em sigilo mesmo”, comentou Renata.

 

“Nada vai trazer meu pai de volta. A gente só espera que logo tenha um esclarecimento, que a justiça seja feita e que alguém seja preso”.

 

A Polícia Civil chegou a deflagrar uma operação, a Office Crime, em novembro, quando advogados e um casal de empresários suspeitos de envolvimento foram alvos de busca e apreensão. As investigações correm sob sigilo e os desdobramentos ainda não são conhecidos.

 

Segundo a filha mais velha, a família acredita que o caso será solucionado e não ficará impune. Apesar disso, a angústia aumenta a cada dia que passa.

 

“Acho que qualquer pessoa que passasse pela situação que a gente passou, esperaria um esclarecimento, esperaria Justiça. Apesar de o meu pai ter trabalhado a vida toda por Justiça, ele foi morto injustamente. A gente acredita que a Justiça vai ser feita, aqui da terra e a de Deus também”, afirmou Renata.

 

“A gente precisa acalmar, acalentar nosso coração de alguma forma com alguma informação, porque é muito angustiante a forma como foi e ainda passar meses e meses e a gente não ter nada”, lamentou.

 

 

Dor da perda

 

Todos à volta sentiram bastante a partida do advogado. Apontado como referência da família e suporte para os irmãos, ele vem fazendo muita falta.

 

A minha vida e a dos meus irmãos mudou do dia para a noite

 “Foi como se a gente perdesse o chão. E eu digo isso também em nome dos meus tios. Ele era uma pessoa muito presente na vida de todos, que se preocupava com todos, cuidava dos irmãos, dos sobrinhos, dos filhos… A gente tinha uma relação todo mundo muito próxima”, detalhou Renata.

 

Para as duas filhas, Renata e Livia, a perda foi ainda mais traumática, pois elas trabalhavam no local em que o pai foi executado e presenciaram a cena do crime.

 

“O assunto é muito delicado e muito doloroso de ser expressado. Eu estava no lugar no horário. Então pra mim também é um pouco difícil estar falando. Porque eu e minha irmã trabalhamos lá, eu estava lá”, contou.

 

“Além da morte, da tragédia, passei por um trauma também. Foi muito difícil, mas a gente está tentando seguir a nossa vida, nossa rotina”.

 

Além disso, ela conta que foi difícil para os irmãos voltarem à rotina normal, sabendo que poderiam ser alvos de alguma ação. “A minha vida e a dos meus irmãos mudou do dia para a noite”.

 

“Não é nem que o medo vai diminuindo, creio que vai passando o tempo você vai aceitando mais a situação e você vê que tem que seguir sua vida independente do ocorrido”.

 

O crime

 

Renato Nery foi atingido por disparos quando chegava ao seu escritório no dia 5 de julho do ano passado, uma sexta-feira. Gravemente ferido, ele ainda foi levado ao Complexo Hospitar Jardim Cuiabá, onde passou por cirurgia, mas faleceu no dia seguinte.  

 

Assista a entrevista na íntegra:

 

 

Leia mais:

 

Ex-presidente da OAB-MT foi morto a tiros à luz do dia em Cuiabá

 

Vídeo mostra momento em que ex-presidente da OAB é alvo de tiros

 

Delegado: caso é complexo e DHPP trabalhou todos os dias

 

Veja os alvos da operação que investiga morte de Renato Nery



Mídia News

336x280ad