Combate à discriminação religiosa será mais rígido após equiparação a racismo e injúria  

Dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos (ONDH), do governo federal, de 2021, mostram que os adeptos das religiões de matriz africana são os mais discriminados no País. O perfil desse público, cujos 21,1% se autodeclaram pretos, torna-se propenso a misturas de vários tipos de violência, que mesclam fé e racismo.

No Brasil, segundo o IBGE, 0,3% da população brasileira pertencem às vertentes da umbanda e do candomblé. No entanto, nos últimos anos, mais da metade das violações à manifestação da fé estão relacionadas às religiões de matriz afro.

Os números podem ser maiores, pois as pessoas se sentem constrangidas em denunciar. O pesquisador Marco Antônio Teobaldo pontuou que os dados oficiais não apontam que a intolerância religiosa está em toda a sociedade brasileira, “existe um grande número de pessoas atacadas de forma violenta ou velada nos ambientes de trabalho, sociais e até mesmo nos ambientes públicos”. De acordo com ele, a maior parte dos casos não chegam às autoridades, em razão das vítimas desconhecerem os canais de denúncia ou não terem confiança no Estado.

Para o titular do Grupo Especializado no Atendimento às Vítimas de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Geacri), delegado Joaquim Filho Adorno Santos, a nova lei traz maior clareza sobre a questão da intolerância religiosa. “Está nova lei é muito salutar e muito importante para as pessoas que fazem o combate da intolerância e para a sociedade em geral, porque, na verdade, quando o Estado edita uma lei, endurecendo penas, criando situações não previstas, a gente tem que entender o seguinte: a partir deste momento o Estado vai dar uma atenção maior a este tipo de coisa. O Estado vai dar uma resposta mais dura a este tipo de comportamento [crime]”. Joaquim Filho ressalta que as pessoas podem denunciar injúria racial ou religiosa pelo WhatsApp da Geacri, o contato é (62) 98495 – 2047. 

O delegado explica o que pode ser tipificado como injúria religiosa. “Praticar, incitar ou induzir a descriminação ou o preconceito contra a religião. Qualquer ato de fala e atitude nas redes sociais que sejam vistos como discriminatório contra uma religião ou contra os seguidores da religião ou contra o culto religioso é considerado crime”, pontua. Entretanto, ele aborda que antes da nova lei havia um conceito aberto sobre o que seria crime religioso. “Porque hoje pode se praticar um crime de descriminação de injúria racial, de intolerância religiosa de tantas formas que a lei não previa uma forma específica”, esclarece, emendando que agora “qualquer fala ou ação que seja vista com desrespeito a religião e que ultrapasse a liberdade de expressão, se torna um crime”.

Liberdade religiosa é garantida pela Constituição Federal | Foto: reprodução

“Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência,” cita trecho da legislação. Assim, no Brasil o crime de injúria racial, sendo equiparado ao de racismo, as penas se tornam mais duras. Por exemplo, quem cometer o crime de injúria racial pode ser punido com reclusão de 2 a 5 anos, anteriormente, a pena era de 1 a 3 anos. Além disso, os dois crimes passam a ser imprescritíveis e inafiançáveis. Outra mudança é em relação aos agravantes: com a pena dobrando se for cometido por duas ou mais pessoas e a injúria for praticado em eventos esportivos ou culturais e para finalidade humorística.

O jurista Walter de Paula Silva, presidente da Comissão Especial de Liberdade Religiosa e fundador do Movimento Aliança de Juristas pela Liberdade, aponta que há brechas no texto. Segundo ele, há duas questões para serem observadas: uma que seria de “proteção da liberdade religiosa e outra velada e cruel, que poderá ser utilizada contra aqueles que pretendem, de forma honesta e genuína, praticarem a sua fé”.



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